Press "Enter" to skip to content

Fronteira Colômbia-Panamá de Barco!

2

Todos as maneiras de atravessar uma das fronteiras mais complicadas do continente americano

INTRO

Um dos dias mais inesquecíveis da minha vida foi também um dos maiores perrengues. Da Colômbia ao Panamá não há estradas, então resolvi arriscar realizar a travessia de barco pelo mar. Já adianto que foram 10 horas incessantes com muita água na cara num barquinho bem desconfortável.

Continue por aqui pra saber todas as formas de cruzar da Colômbia ao Panamá. De quebra, como fui de barco, também vou descrever um pouco da minha experiência por Capurganá e Sapzurro, os vilarejos mais a norte da Colômbia, e pelo arquipélago de San Blas no Panamá.

Se quiser saber mais sobre minha viagem de 3 meses pelo país, acesse o Guia Turístico Completo da Colômbia e o Mochilão de 90 Dias pela Colômbia.

Para os preços indicados em pesos colombianos neste post, considere que quando fui ao país R$ 1,00 valia 900 COP (Ex.: 9.000 pesos = R$ 10,00). Quando visitei o Panamá em 2018, US$ 1,00 custava cercada de R$ 3,70.


COMO IR DE UM PAÍS A OUTRO

Há 3 modos principais de se deslocar da Colômbia ao Panamá, que também podem ser feitos no sentido contrário:

Barco

O roteiro do perrengue pra quem quiser ir de Cartagena à Cidade do Panamá é mais ou menos assim:

  1. Ônibus de Cartagena à Necocli (8h de duração) ou de Medellín a Turbo (8h também). Preço: 60.000 pesos (2018)
  2. Barco de Necocli (2h30) ou Turbo (3h30) à Capurganá. Preço: 70.000 pesos
  3. 30 minutos de barco de Capurganá a Puerto Obaldía, a primeira vila do Panamá. Preço: 40.000 pesos
  4. Travessia de 8 a 10 horas de barco de Puerto Obaldía à Puerto Carti, passando por San Blas. Preço: 100 dólares americanos
  5. 2h30 de carro de Puerto Carti a Cidade do Panamá. Preço: 25 dólares
Localidades de interesse para quem quiser conhecer a região de Capurganá e o arquipélago de San Blas
Localidades de interesse para quem quiser conhecer a região de Capurganá e o arquipélago de San Blas

Essa foi a opção que eu escolhi e já adianto que não é a mais recomendada. Mais pra frente vou contar os detalhes da minha travessia maluca.

Os custos totais para 5 dias conhecendo a região e com os gastos de transportes foram:

  • R$ 700,00 de deslocamento entre ônibus e lanchas
  • R$ 90,00 entrada parque San Blas e outras taxas
  • R$ 94,00 de hospedagem em Capurganá, Puerto Obaldía e Narganá
  • R$ 105,00 com refeições e mercado
  • Total: R$ 990,00 (2018)

Avião

Há vôos que chegam à Cidade do Panamá desde Bogotá, Cartagena ou Medellín. A companhia aérea Viva Colómbia oferece as opções mais econômicas, com preços entre 100 e 200 dólares americanos.

Para quem quiser conhecer Capurganá e região, há um pequeno aeroporto em Puerto Obaldía, a primeira vila do Panamá, de onde saem 3 vôos por semana para a Cidade do Panamá. O preço desta passagem gira em torno dos 110 dólares.


Tour

Existem passeios de 3 dias e 2 noites que saem de Sapzurro, vila próxima de Capurganá, e vão a Puerto Carti. O tour passa por diversas praias paradisíacas do arquipélago de San Blas e pelas comunidades indígenas locais, a preços que podem variar de 275 a 400 dólares. É caro, mas é uma forma de conhecer um dos lugares mais bonitos do Caribe e ainda se deslocar entre os dois países. Acredito que compense mais do que ir com o barquinho pequeno como eu fiz. No preço está incluso alimentação, mas não contempla bebidas, a taxa do parque (US$ 20) e o deslocamento de carro de Puerto Carti à Cidade do Panamá (US$ 25).

Quem organiza o passeio são as agências San Blas Frontera e San Blas Adventures. Ambas oferecem os serviços para os dois sentidos, com início no Panamá ou na Colômbia.

Ouvi dizer que há passeios que saem de Cartagena, passam por San Blas e chegam em Carti e quem realiza estes serviços é a empresa Mamallena.


MINHA EXPERIÊNCIA

Após pegar o ônibus noturno de Cartagena a Necocli, cheguei de manhãzinha na cidade e tomei um cafezão da manhã. Na sequência, peguei o barco até Capurganá, uma vila turística pertencente ao município de Acandi, no departamento de Chocó na Colômbia.

Chegando no porto de Capurganá
Chegando no porto de Capurganá

Capurganá, Sapzurro e La Miel

A vila de Capurganá é uma tranquilidade só. Apesar disso ela possui boa estrutura para turismo, com hotéis, restaurantes e agências. É aqui que você carimba o passaporte para dar a saída da Colômbia.

A vilazinha de Capurganá
A vilazinha de Capurganá

Assim que cheguei de barco, deixei minhas coisas no Hostel Marlin e fui fazer uma trilha que contemplou o seguinte roteiro:

  • Saída a pé de Capurganá, onde se atravessa um grande morro coberto pela vasta vegetação da Floresta de Darién, a selva que separa o Panamá da Colômbia;
  • Chegada na Praia de Sapzurro e caminhada pela orla até chegar na Vila de Sapzurro, onde curti um pouco do mar;
  • Subida de outro morro, desta vez o que demarca a fronteira de ambos os países, e desci até a Praia de La Miel, já no lado panamenho. Pois é, minha primeira entrada no Panamá foi sem passaporte;
  • Regresso a Sapzurro e a Capurganá pelo mesmo caminho. Foram caminhados cerca de 13 km no total deste dia. Tracklog para esta trilha se encontra neste link do Wikiloc.
El Mirador, ponto mais alto do morrão que separa Capurganá de Sapzurro. É possível ver ambas as vilas de seu topo
As calmas águas da Praia de Sapzurro
As calmas águas da Praia de Sapzurro
Cruzando a fronteira com o Panamá a pé
Cruzando a fronteira com o Panamá a pé
A Praia de La Miel no Panamá
A Praia de La Miel no Panamá

Neste dia à noite, conheci o argentino Claudio, o grego Marco e o espanhol Davi e juntos formamos um time pra compartilhar os custos do barco que nos levaria de Puerto Obaldía a Puerto Carti.


Puerto Obaldía

No dia seguinte de manhã, fui à aduana colombiana, carimbei minha saída sem nenhum problema ou demora e fui ao porto encontrar meus novos camaradas.

O barco levou cerca de meia hora pra chegar no porto de Obaldía. Aqui os militares panamenhos fizeram uma revista bem detalhada antes que pudéssemos entrar na vila. Ficamos mais de 1 hora esperando para que checassem apenas 5 mochilas!

Chegamos em Puerto Obaldía pela manhã, com a esperança de pegarmos o barco para sair dali ainda no mesmo dia. Mas infelizmente, não foi possível. Foi muito difícil encontrar um barqueiro que nos levasse e quando achamos, ele nos cobrou 100 dólares por pessoa para sair no dia seguinte.

Fomos na Aduana de Obaldía e carimbamos nossa entrada no Panamá.

Importante: É necessário apresentar uma passagem de saída do país para conseguir a permissão de entrada no Panamá. Eu não tinha e tive que ir à única lan house da vila pra comprar e imprimir uma passagem. Eles também podem pedir que você tenha 500 dólares em espécie, mas isso não me solicitaram. Por fim, me pediram pra tirar uma cópia do passaporte, serviço que a mesma lan house oferece.

A vila ultra pacata de Puerto Obaldía, primeira cidade do Panamá
A vila ultra pacata de Puerto Obaldía, primeira cidade do Panamá

Deixamos as mochilas na Pousada Cande, onde nos hospedamos, e fui com o Cláudio dar uma volta pra conhecer a vila.

Puerto Obaldía é bem parada. Andamos até o aeroporto e voltamos ao porto em menos de 10 minutos. O que fizemos de mais movimentado foi jogar bola com os locais da vila.

Neste dia conhecemos o colombiano José, que estava viajando de moto da Colômbia ao Alaska e, por isso, encontrou um grande obstáculo entre a fronteira dos dois países. Ele estava há 4 dias em Obaldía procurando pessoas pra dividir os custos, visto que os barqueiros estavam cobrando mais de 600 dólares pra levá-lo com a moto. Com a gente ele conseguiu pagar “apenas” 300.


Conto Triste

Conhecemos 3 rapazes sírios em Puerto Obaldía que nos contaram uma das histórias mais tristes que já ouvi na vida.

Eles fugiram da Síria em 2016, em função da guerra civil, e foram morar na Venezuela, um dos poucos países que estavam aceitando sírios. Após 1,5 ano trabalhando no país, a economia venezuelana foi pro buraco e eles se viram obrigados a fugir pra Colômbia e depois ao Panamá, com o intuito de procurar melhores condições de trabalho. Porém, eles foram assaltados quando ainda estavam na Venezuela e perderam simplesmente tudo: roupas, dinheiro, passaporte.

Então, eles tiveram que entrar na Colômbia e atravessar o país todo na ilegalidade. Eles conseguiram chegar em Cartagena e entrar em um barco clandestino com destino ao Panamá. Eles disseram que havia 44 pessoas para um barco de 10. Teve um momento que o barquinho estava quase afundando e o motor chegou a quebrar na madrugada. Eles tinham certeza que iam morrer no meio do Oceano Atlântico. Por fim, conseguiram fazer o motor funcionar novamente e atravessar a fronteira Colôombia-Panamá, só que o exército colombiano avistou o barco e começou a disparar na direção deles. Olha que azar…

Felizmente, ninguém foi atingido e, após 26 horas no mar, conseguiram chegar em Puerto Obaldía. Eles já estavam na vila há mais de 1 mês e o governo panamenho não estava autorizando a entrada deles. Tenho quase certeza que eles foram mandados de volta para a Colômbia ☹. E pensa nuns garotos gente boa e bem humorados…


A Viagem de Barco por San Blas

Acordamos cedinho, mas de nada adiantou, porque o barqueiro Chilapo nos deixou 3 horas esperando. Bom, até então tudo bem porque nos foi passado que o deslocamento de Obaldía a Carti duraria aproximadamente 6 horas e daria pra chegar no destino ainda com luz. Já viu tudo, né?

Saímos às 11h30 e pegamos um mar muito agitado e, por isso, cada marola que batia no fundo do barco dava a sensação que estávamos batendo a bunda no concreto.

Mas o pior de tudo foi toda a água que voava para dentro do barquinho. Quando caiu a primeira gota eu pensei “ah, deve ser só no começo”, mas foi o tempo todo, todinho. Me cobri com meu poncho impermeável, mas ele não evitou que eu ficasse completamente ensopado. Era difícil até de olhar para fora do barco para contemplar a paisagem, de tanta água na cara.

O barquito do prazer
O barquito do prazer

Após 2 horas, paramos para abastecer a lancha no povoado Caledónia, a primeira ilha habitada pelos indígenas Kuna Yala. O problema é que não havia gasolina e tivemos que ficar 1 hora esperando chegar. Tá percebendo que já eram 14h30 e nem havíamos passado da metade ainda?

No caminho, cruzamos dezenas de lindas pequenas ilhas de 20-30 metros de raio com 10 ou 15 palmeiras. Dava muita vontade de pedir pra descer, mas não podia esquecer que aquele era apenas um serviço de transporte. O que combinei com antecedência com o Chilapo era pra que ele me deixasse na Ilha de Perro Chico, uma das mais turísticas da região.

O arquipélago de San Blas compreende 365 ilhas, das quais 50 são habitadas pelos Kuna Yala.

Ilhoticas fofas de San Blas
Ilhoticas fofas de San Blas

E seguimos navegando por mais 2h30min. Ao menos o mar fica um pouco menos movimentado quando as ilhas começam a aparecer.

Paramos às 17h para abastecer de novo e aí a coisa começou a ficar preocupante. Já tinham sido completadas as supostas 6 horas de viagem e ainda faltava um bocado. A essa hora, Chilapo nos revelou que não chegariamos em Carti a tempo e que deveríamos nos hospedar em alguma ilha de San Blas.

Noite se aproximava e nada de Chilapo parar em alguma ilha. Ao invés disso, ele estava decidido a chegar no povoado de Narganá, que estava bem mais longe do que ele sabia. Exato, depois de navegarmos uma hora no breu (sem uma lanterninha que fosse) ele disse a frase confortadora: “hombre, pensaba conocer mejor el mar”. Ele estava claramente inseguro na escuridão e disse que nunca havia navegado após o entardecer. Pensa numa irritação que me subiu.

Nesta hora, ele me perguntou se eu ia pra Perro Chico, mas nas condições noturnas e de desconforto que estávamos, não havia como eu desviar a rota da galera. Ele ainda ficou dizendo que Narganá era muito melhor e então desisti do meu plano inicial. Só depois descobri que o “muito melhor” dele era a vila mais desenvolvida, com luz, restaurantes etc., justamente o contrário do que eu estava buscando.

Bom, a última hora no barco foi o momento mais tenso da jornada. Como Chilapo via que escurecia e que não estávamos perto da ilha de Narganá, ele começou a acelerar bem a lancha, o que fez com que entrasse muuuuuita água no barco. Não havia nada seco. Alguns tiveram computador molhado, outros dinheiro… todas roupas estavam encharcadas e a mochila branca de tanto sal. Nessa hora de pressa e de escuridão, a única coisa que me fazia rir era o Marco dizendo palavrões em grego. Até a moto de José teve partes danificadas. Foi tenso.

Chegamos na ilha de Narganá às 20h totalmente destruídos e sem nádegas, após tanto tempo de impacto nos nossos assentos “acolchoados” com madeira.

Jantamos um peixão que demorou 1h30min pra chegar e fomos dormir numa pousadinha que nos cobrou 8 dólares a pernoite.

Que dia longo!


A Chegada em Panama City

Havíamos combinado de sair às 8h na manhã seguinte, então, acordei às 6 pra conhecer um pouco da vila e conversar um pouco com os índios Kuna Yala. Eles são bem sociáveis e vários se aproximavam pra oferecer ajuda e pra saber de onde eu era. Foi a melhor parte da viagem.

Há algumas cabaninhas de palha nas vilas do arquipélago
Uma pontezinha que conecta duas ilhas na vila de Narganá
Uma pontezinha que conecta duas ilhas na vila de Narganá

Minha ideia era ficar uns dias em San Blas, porém 3 coisas me fizeram ir direto à Ciudad de Panamá: o dia estava muito nublado e chuvoso; o mar com coloração azul escura de tão movido; e o ânimo extremamente baixo após esta jornada perrengosa de barco. Uma pena, porque nas buscas do Google a cor da água é surreal de linda. Depois me arrependi de não ter ido a Perro Chico e esperado lá por uns dias até que o tempo melhorasse. Quem sabe não volto um dia?

Pra finalizar a jornada, saímos às 8h de Narganá e após mais 2 horas de navegação, chegaríamos em Puerto Carti.

Puerto Carti
Puerto Carti

Finalmente descemos do barco com nossas mochilas e pegamos um carro 4×4 até a Cidade de Panamá. No caminho tivemos que pagar a taxa de ingresso do parque.

Chegamos em Panamá City ao meio-dia e nos hospedamos no seu lindo centro histórico. Falarei mais da capital do país num outro post.


CONCLUSÃO

Essa foi minha aventura pra cruzar da Colômbia para o Panamá. Se você quiser conhecer Capurganá e San Blas, recomendo que contrate o tour de cerca de 300 dólares desde Sapzurro. O valor fica mais caro, mas nem tanto se você pensar que vai desfrutar muito mais e que o preço do deslocamento entre os países estará embutido no valor total.

Obrigado por ler!

  1. Carline Carline

    Eu precisa mais informações sobre o barco?
    Se tem barco agora q fazê essa Target de colombia a panamá?

    • VictorPrates VictorPrates

      Olá Carline, as informações que consegui coletar estão todas neste relato. Não sei como está agora com a situação da pandemia e aconselho que procure saber se a fronteira da Colômbia com o Panamá está aberta. Imagino que assim que a pandemia estiver controlada, essa viagem estará funcionando normalmente

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.