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Pernoite no Cume do Pico de São Sebastião – Ilhabela/SP

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Tudo o que você precisa saber para viver esta aventura até o topo da montanha mais alta da ilha

RESUMO

Relato da ascensão tensa para o topo do Pico de São Sebastião (1.379 msnm), ponto mais alto de Ilhabela/SP – Brasil, realizada em Março/2017. O trajeto ida e volta de 15 km foi percorrido em 2 dias, sendo 7 horas e meia pra subir e 5 horas pra descer com uma mochila bem grande (~15 kg). Uma opção é fazer um bate-volta com a menor mochila possível, assim pode-se terminar a trilha na metade do tempo. O caminho está mal marcado e com diversas passagens obstruídas por bambus, que fazem com que você tenha que se arrastar no chão para passar. Leve cerca de 5 litros d’água se for acampar, pois só há pontos de captação até a cota 270 m. O topo do pico possui espaço pra 2-3 barracas e revela lindas vistas da ilha, do Canal de São Sebastião e da Serra do Mar paulista.

INTRO

Lá vou eu mais uma vez movido por este impulso inexplicável por topos de montanhas, onde você contempla os melhores panoramas, lindos nasceres e pores do sol e céus estrelados inesquecíveis. Se você também é dominado por este impulso, então sabes que não há como resistir quando se descobre que é possível subir a montanha mais alta de uma ilha.

Então, lá fui eu subir sozinho o Pico de São Sebastião, na famigerada Ilhabela, com seus 1.379 msnm.

Além das belas praias, a ilha é conhecida pelos seus picos proeminentes, dentre eles o Pico do Baepi, com 1.048 msnm, o qual eu havia subido 2 dias antes.

Segue a localização em planta dos dois picos acima mencionados, retirado do Google Earth:

Baepi e Tião

Como os níveis de dificuldades desses picos são muito distintos, eu os separei em dois relatos. A descrição da subida para o Pico do Baepi se encontra aqui, enquanto para saber mais do Pico de São Sebastião basta continuar lendo o presente relato.

O tracklog que eu marquei no meu GPS da trilha para o Pico de Sebastião se encontra neste link.


PROGRAMAÇÃO E LOGÍSTICA

De ônibus

Pegue ônibus para São Sebastião com a Viação Litorânea (litoranea.com.br), desça na rodoviária da cidade e ande 1 km até a balsa para Ilhabela, a qual é gratuita para pedestres e ciclistas. A balsa sai de 30 em 30 minutos das 05:30 às 23:30 e depois de hora em hora no restante do tempo, como consta no site ilhabela.com.br/balsa.

Uma vez na ilha você precisará pegar um ônibus que vai para o sul da mesma. Peça para descer no ponto da Cachoeira dos 3 Tombos, entre as praias do Portinho e da Feiticeira. Ao descer do bus ande poucos metros até o acesso para esta cachoeira (há placas) e suba por 25 minutos até chegar ao início da trilha.

Apenas uma informação caso esteja sem carro e tenha tempo para conhecer outras atrações da ilha. Há uma estrada (SP-131) que corta Ilhabela de norte a sul pela costa oeste, porém as linhas de ônibus saem da balsa e não conectam o lado sul com o lado norte (até existe uma linha, mas ela passa apenas duas vezes ao dia). Portanto, procure hospedagens próximo ao centro para evitar pegar 2 ônibus para chegar em algum lugar distante. Outra opção é pegar carona, visto que o pessoal da ilha parece ser bem solícito.


De carro

Vá até São Sebastião e encare uma fila na balsa, cujos valores para carro para vão de R$ 21,50 de segunda a sexta e R$ 29,00 de sábado, domingo e feriados.

Após atravessar o canal, saia até a estrada e dirija para sul até virar à esquerda na indicação da Cachoeira dos 3 Tombos. Cerca de 300 metros após entrar no acesso há uma portaria que controla a entrada dos carros. Infelizmente, esqueci de perguntar se qualquer pessoa pode acessar o condomínio de carro. Se não puder, deixe-o um pouco antes da portaria. Se for possível entrar com ele você poupará cerca de 20 minutos de caminhada.


COM OU SEM GUIA

Eu fui sem guia e errei o caminho diversas vezes, pois ele está bem mal marcado e existem bifurcações confusas e árvores caídas na trilha. Se não fosse pelo GPS eu estava lá até agora, então é altamente recomendável a contratação de um guia.

Para minha navegação, utilizei o tracklog do Michel Kluger no Wikiloc, o qual se encontra neste link.

Não conversei com agências, mas na Praia do Julião (próxima à entrada da trilha) conheci um local que me ofereceu a guiada por R$ 100,00. Não foi difícil encontrar alguém, então não hesite em ir lá e perguntar por um.


O QUE LEVAR

No corpo

  • Uma cueca ou calcinha confortável
  • Um par de meias
  • Uma camiseta de manga comprida
  • Uma calça pra trekking
  • Um par de botas pra trekking
  • Um par de luvas
  • Um boné/chapéu

Nas costas

  • Mochila semi-cargueira
  • Barraca
  • Saco de dormir pra 11ºC conforto.
  • Isolante
  • Segunda pele camiseta e calça. Os mais friorentos podem levar blusa e calça de fleece também
  • Travesseiro inflável
  • Lanterna
  • 4 a 5 L de água
  • Comida fria (basicamente rap10 e barra de cereal). Poupe peso de panelas. É só uma noite mesmo
  • GPS

Opcional

  • Facão (também conhecido como terçado)

RESUMO DE GASTOS (2017)

  • Ônibus São Paulo -> São Sebastião = R$ 65,00 * 2 = R$ 130,00
  • Ônibus centro de Ilhabela a início da trilha = R$ 3,90 * 2 = R$ 7,80
  • Almoço + Jantar + Açaí = R$ 55,00
  • Comida pra trilha = R$ 80,00

GASTOS TOTAIS = R$ 272,80*

* Para uma pessoa considerando ida e volta de São Paulo e gastos em um final de semana comum. No meu caso eu segui adiante para Ubatuba.


O RELATO

Após conhecer o Pico do Baepi na Ilhabela, eu passei um dia sozinho tranquilo na Praia do Julião. Peguei um snorkel emprestado com a Mayra, que me hospedou no ótimo hostel Casa das Oliveiras, e peguei um ônibus para o sul da ilha.

A praia é bem linda, com uma água bem clarinha e várias pedras em seus dois cantos. Eu peguei o snorkel e fiquei uns 30 minutos nadando e contemplando uma infinidade de peixes. Até encontrei uma tartaruga, com a qual fiquei admirado ao nadar atrás por alguns segundos.

Da Praia do Julião é possível ver o Pico de São Sebastião. Visto de baixo, ele nem é tão pomposo e nem parece ser o mais alto da ilha, mas não por isso ele deixaria de ser o meu objetivo para o dia seguinte.

Praia do Julião
Praia do Julião e Pico de São Sebastião (bem atrás da minha cabeça)

Pela noite fui ao mercado comprar comida para a trilha. Arrumei minha mala e fui dormir.


Dia 1 – A Ascensão

Acordei às 07:30, tomei um café no hostel e fui para o ponto pegar o ônibus. Esperei, esperei e ele não passava, então decidi andar 2 km até a rotatória da balsa pra pegar o outro ônibus para o sul da ilha. Este bus também demorou muito, tanto que no momento que ele passou já estava decidido a pedir carona.

Entrei no bus e após 15 minutos desci no ponto entre as praias do Portinho e da Feiticeira, que fica cerca de 100 metros do acesso para a Cachoeira dos 3 Tombos.

Todo este atraso fez com que eu só começasse a caminhar às 10:20, mas ainda não havia me preocupado, pois havia lido que as 8 horas de luz que eu teria seriam o suficiente pra chegar ao cume do pico.

Uma vez na rua de acesso à cachoeira, após cerca de 300 m de caminhada você encontrará uma portaria de um condomínio de casas. Avisei o guarda que faria a trilha para o Pico de São Sebastião e ele ficou um pouco surpreso, não sei se porque ninguém faz ou devido ao fato de estar sozinho. Deixei meu nome e o telefone do hostel caso eu não voltasse no dia seguinte até o final da tarde.

De dentro do condomínio vire a primeira direita e depois à esquerda numa cancela. Siga reto e após a rua fazer uma curva de quase 180º vire à esquerda. Pronto, em poucos metros chegará ao pé da trilha. Esse é o caminho mais aconselhável, pois ele é percorrido no asfalto e cai direto no começo oficial da trilha.

Eu errei o caminho e fui cair na Cachoeira dos 3 Tombos. Daqui há uma trilha mal marcada que segue à esquerda do salto que logo encontra a trilha principal, porém eu não recomendo esta opção porque o caminho é bem inclinado e escorregadio. A única vantagem aqui é que você passará pela cachoeira.

Cachoeira dos 3 Tombos
3º e mais belo tombo da Cachoeira dos 3 Tombos

Por volta das 11:00 encontrei a trilha correta e fiquei mais relaxado, pois ela fica mais batida daqui em diante.

Os próximos 400 m de trilha seguem próximos ao rio que dá origem à cachoeira, porém ao chegar próximo à cota 270 m você se despedirá dele. Infelizmente, este é o último ponto d’água da trilha então aproveite para encher o estômago e abastecer os cantis. Eu segui com 4 litros, mas eu tive que dar uma racionada e não cozinhei à noite.

Agora a aventura começa a dar as caras. Se você gosta de caminhada sem surpresas, este não é o passeio pra você!

Deste ponto até alcançar o cume do pico, você caminhará por Mata Atlântica densa numa trilha pouco utilizada, com infinitos galhos dificultando a passagem, inúmeras árvores caídas, porções escorregadias em que não há onde se segurar (tomei uns 4 tombos) e muitos trechos que você não encontrará o caminho com facilidade.

Pra se ter uma ideia de como a floresta é fechada, em nenhum momento antes do cume você avistará qualquer mirante que apresente vista para fora da mata. Além disso, a precisão do GPS fica bem menor, outra razão pra eu ter errado o caminho algumas vezes.

Mata Atlântica Densa
Árvore vermelha e mata fechada

Porém, a brincadeira ainda não tinha começado. Cerca de 2 km a frente do último ponto de água e a partir da cota 750 m surge os seres que tentarão estragar o seu humor: os bambus 🙂

Há uma quantia imensa de bambuzais passando próximo à trilha e boa parte deles estão caídos no caminho. Não há como contorná-los ou passar por cima, só o que resta é passar por baixo dos bambus. No começo basta engatinhar, depois é necessário deitar no chão e se arrastar, até um nível que é preciso tirar a mochila e ir deslizando de lado, puxando-a com uma das mãos e se movimentando com a outra. Pensa numa dor de cabeça!

Cuidado com as jaracas (marrons) e jararacussus (pretas e amarelas), que são extremamente abundantes nessa porção da mata atlântica. Sempre olhe com cuidado antes de se aproximar do solo, inclusive nos pontos de água, que as jararacas adoram. Além disso, convém levar um facão pra abrir caminho nos pontos mais fechados da trilha.

Bambu!
Bambus “amigos”

Além de diminuir muito o ritmo de “caminhada”, eu não estava muito feliz em deitar no chão visto que Ilhabela é bem famosa pela alta quantidade de cobras que habitam. Felizmente não encontrei nenhuma peçonhenta, só uma caninana.

E não ache que só tem um bambuzalzinho na subida. Eu contei no mínimo 12 trechos, por vezes longos, que você precisa deitar no chão para seguir adiante. Mas as dificuldades ainda não tinham parado por aí.

Há 3 trechos de bambus por volta da cota 750-800 que cessam por cerca de 1,2 km e você até fica com a impressão que eles não voltarão. Doce ilusão.

Parece que estou descrevendo a trilha mais tensa do mundo, hahaha. Não é tudo isso, mas é importante você não se arriscar caso não esteja acostumado com um pouco de aventura.

A partir da cota 1.030 m os bambus pentelhos retornam e te acompanharão até chegar ao cume do pico, porém pra piorar há algumas partes inclinadas, e se arrastar no chão com a mochila na mão numa subida enlameada não é exatamente o sinônimo de facilidade.

Mais Bambu!
Mais e mais bambu

Próximo ao cume, por volta da cota 1.200 m há um trecho bem perigoso e inclinado em que é preciso agarrar em galhos pra prosseguir. Com mochila pesada é preciso bastante cautela.

Todas as dificuldades apresentadas, e que pra mim foram surpresas, fizeram com que eu chegasse ao topo do pico junto com o pôr-do-sol, em pouco mais de exaustivas 7 horas e meia de caminhada/rastejada.

Quando se chega ao topo logo se vê uma boa área pra montar barracas, o que me trouxe bastante tranquilidade. Porém, como o Pico de São Sebastião é um morro de topo aplainado, eu fiquei com medo de não haver nenhum local que apresentasse um panorama de contemplação que não fosse a própria floresta.

Mas pra minha alegria imensa, há dois grandes blocos de rocha que não são difíceis de subir e que revelam aquela vista que só topos de montanha podem revelar. Ufa!

O visual é estonteante e recompensador. São lindas as vistas da ilha, do Canal de São Sebastião e da Serra do Mar paulista, a qual está bem mais baixa que o pico, já que o mesmo possui 1.379 m enquanto a serra está entre 700 e 800 msnm. O outro lado da ilha estava coberto por nuvens e só no amanhecer do dia seguinte eu saberia como seria.

Pôr-do-sol
Primeira vista do céu nas 7 horas de trilha foi o pôr-do-sol lindo
Ilhabela e São Sebastião de noite
As cidades de São Sebastião e Ilhabela brilhando no anoitecer

Após uma hora de contemplação armei a barraca no escuro, jantei e fui dormir. Assim que deitei e relaxei no saco de dormir, eu comecei a pensar nas dificuldades do dia e na sensação doida de estar sozinho naquela montanha e em como não existe nada como a interação roots com a natureza.


Dia 2 – A Descida

Acordei às 5:30 pra ver o queridão nascer. Pra minha sorte as nuvens abriram e foi possível contemplar o sol surgindo na direção da Baía de Castelhanos e o formidável panorama 360º que se tem da ilha.

Nascer do sol!
Lindíssimo amanhecer do topo do pico
Nascer do Sol!

Agora alguns registros aéreos matinais:

Vista Aérea!
Vista aérea mostrando a pedra no cume do Pico de São Sebastião e a sombra da montanha
O Canal de São Sebastião
Pedra do cume do pico e o Canal de São Sebastião

Veja no link abaixo o giro aéreo que fiz no pico:

Ainda maravilhado, iniciei o caminho de regresso por volta das 7:00 horas.

A descida foi mais fácil pois já sabia o que esperar no caminho. Em 5 horas e meia de trilha cheguei de volta na guarita.

Fui andando até a Praia do Portinho, pois apesar de não ser a mais procurada de Ilhabela, era o lugar que meus pais frequentavam nos anos 70 e 80 e queria ver como era esta praia com tanta história familiar. Imagino que antigamente ela não possuia mesas e cadeiras, haha.

Portinho

E foi o fim das minhas aventuras em Ilhabela. Neste mesmo dia peguei a balsa e o ônibus para Ubatuba. Na continuação da minha jornada subi o Pico do Corcovado, o qual você pode saber mais neste relato aqui.

Obrigado por ler!

Abraços!

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